Como o setor privado pode apoiar a OTCA no combate ao desmatamento
Nesta semana, os chefes de Estado dos oito países que compõem a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) assinaram a Declaração de Belém, documento histórico para enfrentar o desafio de proteger a integralidade da região amazônica, combatendo a pobreza e as desigualdades, “com o propósito de reunir esforços para promover o desenvolvimento sustentável na região de forma harmônica, integral e inclusiva”. Ainda que o documento não assuma uma meta comum para acabar com o desmatamento – embora haja uma diretriz para o desmatamento zero até 2030, puxada pelo compromisso do governo brasileiro – os 113 parágrafos enfatizam a urgência da cooperação regional para combater o desmatamento, deter o avanço das atividades ilegais de extração de recursos naturais e promover iniciativas de gestão do uso da terra e modelos de transição para a sustentabilidade, com o ideal de alcançar o desmatamento zero na região.
Os Diretores da BVRio, Mauricio Moura Costa e Beto Mesquita, participaram das reuniões pré-cúpula em Belém, incluindo a participação em um painel focado em financiamento para impulsionar a redução do desmatamento e a restauração produtiva na Amazônia. Eles também integraram reuniões e workshops focados nos sistemas de governança climática e estratégias jurisdicionais de REDD+ dos estados da Amazônia Legal brasileira.
O Diretor de Florestas e Políticas Públicas da BVRio, Beto Mesquita, membro da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura – iniciativa multissetorial com mais de 350 membros, incluindo entidades do agronegócio, empresas, organizações da sociedade civil, setor financeiro e academia – discute neste artigo o significado da Declaração e, principalmente, como ela poderá funcionar na prática.
“A colaboração é o elemento essencial para atingir com sucesso a meta de desmatamento zero. Nenhuma entidade, solução ou país conseguirá fazer isso sozinho. É necessário um esforço regional e global.
Do mesmo modo, os governos não serão capazes de oferecer soluções sozinhos. É essencial que o setor privado também esteja comprometido com a proteção e a recuperação da Amazônia, para que os países não apenas cumpram as leis, como o Código Florestal Brasileiro, mas criem incentivos que vão muito além das obrigações legais.
Essa é uma oportunidade para que esses países encontrem mecanismos de cooperação, integração e colaboração para proteger efetivamente a floresta e, principalmente, os povos e comunidades que vivem e dependem dela. A expectativa é de que os compromissos e metas assumidos pelo Brasil – como o desmatamento zero até 2030 e a promoção de atividades econômicas baseadas na floresta em pé – sejam propulsores de compromissos mais ambiciosos dos demais países, sem empecilhos nas negociações onde não há convergência, como, por exemplo, a questão da exploração de petróleo na região. Espera-se que um acordo de cooperação entre os países fortaleça a agenda de combate a ilegalidades transnacionais e promova a restauração florestal em larga escala.
A boa notícia é que o setor privado tem se mobilizado de diversas formas e tem condições de ampliar iniciativas com o apoio de políticas públicas. Em carta aberta aos membros da OTCA, a Coalizão Brasil destacou algumas diretrizes para que as empresas privadas promovam a bioeconomia, fortaleçam programas de pesquisa e desenvolvimento e incentivem economias locais baseadas na sociobiodiversidade. Atualmente, pelo menos quatro startups brasileiras estão dedicadas a propor soluções para a restauração florestal, aplicando diferentes abordagens, métodos e arranjos financeiros. O setor empresarial também está animado com a proposta do governo de implementar o mercado brasileiro de redução de emissões. De acordo com as estimativas do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, esse mercado alavancaria mais de US$ 120 bilhões de investimentos no Brasil até 2030. Alguns especialistas afirmam que pelo menos 50% desse valor seria investido em soluções baseadas na natureza. Esse cenário pode beneficiar iniciativas como o SIMFlor, um programa da BVRio em parceria com a Sustainable Investment Management (SIM) que oferece compensação financeira aos proprietários rurais que mantêm excedentes de Reserva Legal.
A promoção da agricultura de baixo carbono, que exige tanto assistência técnica quanto investimentos públicos e privados, é outra oportunidade. Nesse âmbito, iniciativas como a Responsible Commodities Facility, outro programa da SIM que incentiva os produtores de soja no Cerrado a não converterem excedentes de Reserva Legal em suas fazendas, teriam grande potencial para combater o desmatamento permitido por lei.
O projeto PlanaFlor estimou que serão necessários US$ 10 bilhões para converter 20 milhões de hectares de pastagens degradadas para implementação de sistemas integrados de produção agropecuária de baixo carbono, como a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF).
Embora os países amazônicos não tenham se comprometido com metas claras e ambiciosas em termos de redução do desmatamento e aumento dos investimentos em uma nova economia baseada em florestas saudáveis em pé e rios fluindo sadios, há oportunidades e demanda, no Brasil e em outros países, para investimentos em inovação e sustentabilidade. As premissas e diretrizes gerais foram estabelecidas pela Declaração de Belém, incluindo sólidas recomendações relacionadas aos direitos das comunidades indígenas e outros povos tradicionais.
As organizações da sociedade civil devem apontar caminhos e alternativas, com base em soluções inovadoras, inclusivas e equitativas. O setor financeiro e as empresas privadas devem se comprometer, prevendo investimentos e assumindo que o maior risco que corremos é o risco de colapso do clima e dos serviços ecossistêmicos, dos quais dependem todas as atividades econômicas e produtivas. Há um chamado urgente para a ação. E o momento de agir é agora.”